Bico de papagaio, hérnia de disco, artrose… por volta dos 50 anos, ou até antes, esses nomes soam como maldições prontas para surgirem a qualquer momento. O temor é justificado, afinal, são essas as doenças que se aproveitam do desgaste provocado pela idade para se instalar e provocar dores intensas nas costas.
“As alterações degenerativas do envelhecimento atingem os discos de cartilagem que ficam entre uma vértebra e outra, as articulações e a musculatura que sustenta a coluna, por isso esses problemas aparecem”, explica Alexandre Fogaça, ortopedista e professor da Faculdade de Medicina da Unversidade de São Paulo.
Mas é bem antes disso que os cuidados com a coluna cervical precisam começar. Primeiro, porque os maus hábitos antecipam o estrago. E mesmo se o diagnóstico de algum problema nas costas já existir, isso não quer dizer que a pessoa sofrerá para sempre. Pelo contrário, com as medidas a seguir é possível aliviar o peso nas costas e preparar essa estrutura tão importante para as próximas décadas.
O certo é se atentar para a distribuição de peso e alinhamento do corpo quando estiver em pé. Usar sapatos de salto alto, por exemplo, joga o quadril para trás, algo que pode ser danoso a longo prazo. No entanto, o mais problemático mesmo é aquele tempo que passamos sentados. “A lombar deve estar totalmente apoiada no assento, com ângulos de 90 graus nas articulações do quadril e do joelho, ensina Alberto Gotfryd, ortopedista do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo.
Já os pés devem ficar apoiados no chão ou em um suporte para não tensionar a lombar. Se está difícil, vale considerar a Reeducação Postural Global (RPG). “Mas só costumo recomendá-la quando os músculos já estão fortalecidos, pois eles que colaboram nessa reorganização”, observa Roberto Rached, fisiatra do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo. O que nos leva ao próximo ponto.
Vale combinar atividades aeróbicas com as que fortaleçam a musculatura do dorso, chamada de estabilizadora profunda da coluna, para prevenir o desgaste prematuro. Caminhadas entram no primeiro grupo e yoga, pilates e musculação no segundo. Todas essas atividades possuem efeito comprovado no alívio do sofrimento e fortalecimento da região posterior do corpo.
“Escolha o que dá prazer, mesmo que seja apenas uma caminhada”, aconselha Vinicius Cunha de Oliveira, fisioterapeuta e pesquisador da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, em Minas Gerais. “O que mais importa é manter a frequência recomendada de pelo menos 30 minutos por dia, cinco vezes por semana.”
Essa movimentação também é fundamental para tratar as dores, mesmo quando já existe uma doença instalada. Vale começar com atividades de baixo impacto para só então aumentar a intensidade, e sempre com a orientação de um profissional. Caso contrário, existe o risco da lesão aumentar em vez de diminuir.
Um estudo conduzido por Cunha na Universidade Federal de Minas Gerais em 2014 observou que o isolamento social é um dos fatores que aumenta o estrago da dor lombar. Por outro lado, realizar atividades em grupo, como exercícios coletivos, ajuda a aliviar o peso. “Alguns trabalhos relacionam problemas de ordem psicossocial, como depressão e estresse, à piora na dor nas costas”, comenta o fisioterapeuta.
Isso é até mais mais relevante do que o diagnóstico. “Em alguns casos, o exame de imagem mostra um problema, mas não é necessariamente ele que está causando a dor, e sim este conjunto de fatores sociais e maus hábitos”, aponta Cunha. Aliás, isso faz o exercício ser ainda mais necessário. “Tanto que a maioria dos atletas profissionais de tênis, por exemplo, tem artrose na coluna mas não sente dor”, lembra Rached.
Sem contar que costas sedentárias possuem um risco maior de sofrer a dor idiopática, ou seja, sem origem conhecida. Essa informação é importante porque as doenças mais sérias de coluna respondem por apenas 1% das dores na lombar, as mais comuns e incapacitantes entre a população. “Até 94% desses casos ocorrem por causas múltiplas ao invés de um problema específico”, diz Cunha.
Para se ter ideia, um estudo do ano passado conduzido em parceria com a Universidade de Sidney e a Universidade Federal de Minas Gerais, envolvendo mais de 30 mil brasileiros, identificou que 25% deles sofriam com esse tipo de incômodo. Mas, atenção: se a dor durar mais de seis semanas, piorar e limitar cada vez mais os movimentos, além de estar estar associada a outros sintomas como febre e formigamentos, vale fazer uma investigação aprofundada com o médico especialista em coluna.
Já deu para perceber que ficar parada é tudo o que a coluna não precisa. “O disco que fica entre as vértebras precisa de movimentação para se manter hidratado, e o ressecamento é um dos fatores que favorece o aparecimento de hérnias lá na frente”, explica Gotfryd.
Por isso, a dica para quem trabalha no computador é levantar e esticar o esqueleto de tempos em tempos. O que não quer dizer necessariamente fazer a ginástica laboral. “Basta levantar de hora em hora, andar um pouco e alongar o corpo, ensina o ortopedista.
O monitor do seu equipamento deve ficar na altura dos seus olhos, pois manter a cabeça inclinada para baixo também gera uma sobrecarga na coluna. A postura inadequada ao encarar a telinha pode ainda favorecer o aparecimento da dor cervical, que atinge a porção de cima das costas e atrapalha bastante a vida.
Essa é clássica. Quando algo cai ou vamos pegar um bebê, por exemplo, é quase automático dobrar as costas para a frente na tentativa de alcançar o chão. O problema é que o movimento exige que a musculatura da coluna faça a força para erguer o objeto.
“A maneira correta é dobrar as pernas e usar as coxas para sustentar o movimento. Isso por si só já ajuda muito a preservar a coluna, pois é um movimento que repetimos muitas vezes ao dia”, aponta Gotfryd.
O colchão mais caro não é necessariamente o melhor, nem aqueles ortopédicos super rígidos. Pessoas com excesso de peso, por exemplo, precisam de colchões que respeitem a curvatura do seu corpo, e não tentem esticar a pessoa, mas ele também não pode ser macio demais. Já se você sentir muito incômodo ao acordar, é sinal de que precisa rever o local do descanso.
Já a postura ideal é de lado, mas se você não conseguir ficar assim, tudo bem. O importante é que cabeça e pescoço estejam totalmente apoiados no travesseiro e alinhados com o corpo. Ombro e pernas devem estar o mais reto possível, por isso os especialistas recomendam que haja mais de uma almofada que dê esse suporte na cama. Uma vai no meio das pernas e outra apoia o braço se a pessoa ficar de lado.
A coluna tem uma musculatura específica, mas não é só ela que precisa de atenção. A partir dos 40 anos, começa um período de perda de massa muscular e mudanças no metabolismo que culminará na sarcopenia na terceira idade, quadro caracterizado por esse déficit e pela diminuição na força. Ela aumenta o risco de quedas e até de morte nessa fase da vida.
A boa notícia é que com exercícios físicos –eles de novo!– e uma boa alimentação tornam possível a recuperação de parte dessa perda. A musculação é uma boa pedida, mas sempre com orientação profissional e sem cargas intensas logo de cara, além das atividades que trabalham mais a musculatura que sustenta a coluna, como vimos acima.
Só não vale usar a falta de intimidade com os halteres como desculpa. “Hoje sabemos que o exercício local é eficaz e bem-vindo, mas trabalhar a musculatura de modo geral também tem esse efeito protetor para as costas”, diz Cunha.
Diabetes e hipertensão, dois dos males mais populares entre a população brasileira, prejudicam o corpo todo. E com a parte das costas não é diferente. “Manter uma vida equilibrada é uma prevenção básica contra qualquer doença da coluna relacionada à idade”, destaca Gotfryd.
“Não necessariamente o desgaste é o que vai causar dor. Um organismo saudável, com a pressão e a glicose controlada, sentirá poucos os efeitos do envelhecimento”, aponta Rached.
*Matéria originalmente publicada no site da uol.
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